Falta informação no mundo da informação
Ao pesquisarmos no Youtube a expressão “14/88” encontraremos 4710 vídeos reelacionados. No Google o número sobe para assustadores 1.350.000 resultados. Mas o que isso tem a ver com informação?
A famigerada “14/88” é uma ignominiosa referência ao nazismo e ao seu líder maior, Adolph Hitler. O número “14” é uma referência as 14 palavras da frase do neonazista David Lane: We must secure the existence of our people and a future for white children. Traduzindo: Nós devemos assegurar a existência de nosso povo e o futuro das crianças brancas. O “88”, significa “HH”, já que o H é a oitava letra do alfabeto, numa referência ao famoso “Heil Hitler”. Ou seja, a internet está repleta de pessoas desinformadas e, talvez por isso, ainda seduzidas pelas idéias do louco líder alemão que matou milhares de pessoas inocentes ou indefesas, em nome de um ideal de eugenia (limpeza étnica) e supremacia da raça ariana e alemã, sobre todos os povos.
Mas a pergunta permanece: o que isso tem a ver com a informação? Simples, estamos rodeados de informações por todos os lados, porém dificilmente nos aprofundamos muito nelas. Assim, as idéias de um lunático morto há mais de 70 anos, ainda são propagadas como grandes ideais a serem seguidos. Afinal, se olharmos superficialmente, Hitler foi um grande líder. Herói da primeira guerra mundial, político de ascensão meteórica, gestor que transformou uma Alemanha, em ruínas, numa das maiores potências mundiais da época e líder de um povo desiludido que passou a acreditar em seu próprio país e em seu comandante. Naquela época, a propaganda de Paul Joseph Goebbels fazia de Hitler um herói e do Partido Nacional Socialista uma esperança de dias melhores para o país. As derrotas nas batalhas, durante a II Guerra Mundial, eram maquiadas como vitórias retumbantes e transmitidas pelos rádios, insuflando o espírito nacionalista e quase ufanista do povo alemão. Nos cinemas em Berlim, somente vitórias esmagadoras sobre ingleses, franceses e poloneses. Enfim, Hitler era um pop-star para o povo alemão de 70 anos atrás. Iniciou uma tática de controle da população através da mídia e foi seguido por diversos político-ditadores-midiáticos modernos, como Vargas, ACM e Sarney, só para citar alguns.
Porém, quando os meios de comunicação em massa se limitavam a uma rádio controlada pelo governo, esse controle e essa adoração ao líder do III Reich eram compreensíveis. Mas hoje é indignante. Na era da informação, com milhares de relatos das atrocidades nazistas contra judeus, negros, homossexuais, ciganos e estrangeiros em geral, é inconcebível. O pior é saber que exemplos de preconceito contra negros, homossexuais, ciganos, brasileiros nordestinos (a SS não nos conhecia, graças a Deus) tornaram-se lugar comum na internet do país “mais tolerante do mundo”. Isso sem contar os casos de preconceito religioso, que levaram praticantes da umbanda e do candomblé a se declararem “espíritas” (neologismo criado por Allan Kardec para definir os seguidores da sua doutrina codificada) para fugir das hostilidades de católicos e evangélicos. É difícil entender isso hoje, quando a maioria esmagadora dos internautas nem era nascida quando ocorreu o suicídio do covarde líder alemão. Um triste retrocesso ao “pensar-se superior a alguém”.
Nos vídeos do Youtube aparecem comemorações ao centenário de vida (sic) de Hitler, discursos inflamados e aplaudidos do homem de bigode ridículo, marcha de milhares de soldados alemães representando a força nazista, entre outras imagens editadas. Alguns “produtores” dos vídeos defendem-se afirmando ser um trabalho acadêmico, e não um ato de apologia aos crimes do holocausto.
Tirando alguns épicos, como “A Lista de Schindler” e “O menino do pijama listrado”, a grande maioria dos filmes de guerra preferem ressaltar o heroísmo dos soldados e não mostrar de forma contundente os crimes de guerras cometidos por ambas as partes. Nos canais de TV aberta documentários são raríssimos. Informação é raríssima. E assim vivemos eternamente de globorepórteres sobre a fauna, flora, alimentação, saúde ou a vida e morte de algum famoso.
Creio não existir pessoas más, e sim, ignorantes. Acredito que se houvesse informação de qualidade, não teríamos tantos neo-nazistas e pessoas preconceituosas em nosso país. Mas como não estamos mais na era do rádio, e o Fürer foi covarde o suficiente para se matar antes de pagar pelas suas atrocidades, recomendo o vídeo-documentário “Auschwitz: os Nazistas e a Solução Final”, produzido brilhantemente pela BBC e Londres. É rapidinho, quase o tempo de um Big Brother Brasil. São quase 50 minutos de história que não deve ser esquecida, para não ser repetida. E você não precisa votar em ninguém. Hitler já foi eliminado.
Publicado no Observatório da Imprensa