Quando o rei Dom Manuel recebeu a carta de Pero Vaz de Caminha, dizendo que “nessa terra, em se plantando, tudo dá”, sua felicidade foi enorme. Porém, uma outra frase, não muito famosa da carta, não pode ser esquecida: (…) “Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro – o que d’Ela receberei em muita mercê”.
Ali, na certidão de nascimento do Brasil, Caminha dava início a uma prática tipicamente nossa, o “jeitinho brasileiro”, pedindo ao Rei uma carona de barco para seu genro.
Esse “jeitinho” pode ser visto de diversas formas. Algumas criminosas, como as praticadas pelos políticos em suas negociatas. Outras mais lúdicas, chamadas de “malandragens”, aquela forma de levar vantagem em tudo. E ainda existem as inofensivas e funcionais, conhecidas como armengues ou gambiarras.
O armengue é quase cultural. Pense num povo que gosta de improvisar e lá estará o brasileiro. Se a imagem da TV está ruim, coloca pedaço de Bombril (esponja de aço) na antena e resolve. A sandália de borracha quebrou, coloca um pedaço de arame e resolve. E depois da internet os exemplos se multiplicaram exponencialmente. É tanta gambiarra que a gente fica assustado.
Gente cozinhando macarrão em cafeteiras, fritando linguiça num ferro elétrico, improvisando com alicates de unha pra ajustar a tomada, usando panela quente como ferro elétrico, usando embalagem de leite como prato, ventilador sendo usado como cooler de notebook, pedaço de garrafa furada para fazer de um cano um chuveiro, clips dobrado como suporte de teclado, máquina de lavar velha vira cooler de cerveja, dentre outras.
Lembro de uma, genial, que aconteceu comigo. Na minha infância a gente não tinha chuveiro. No banheiro tinha um cano e uma transmissão. A água caia forte e chegava a doer na cabeça. Certa vez reclamei com meu pai que queria uma água caindo fininha. Ele rapidamente pegou um escorredor de macarrão e seguro entre o jato d’água e minha cabeça. Foi a primeira vez que tomei banho de chuveiro graças a engenhosidade de meu pai.
Concluindo, acredito que o armengue seja a criatividade do pobre, elevada à 10ª potência, para resolver os problemas do dia-a-dia. O “jeitinho brasileiro” teve origem na carta de Pero Vaz de Caminha e seguiu com o Rei D. João VI vendendo títulos de nobreza para financiar a corte, fugida de Napoleão, aqui no Brasil. A prática se efetivou com o Imperador D.Pedro I dando título de nobreza pro marido da amante dele, apenas para que o caso não fosse parar na imprensa. Perpetuou-se no famoso quadro da Independência Brasileira que é plágio de um quadro retratando uma vitória de Napoleão. E agora, se imortalizou com as gambiarras espalhadas pela internet.
É preciso respeitar a criatividade do pobre brasileiro. Pois no dia que a NASA estudar o cérebro dessa galera, vamos morar em Júpiter rapidinho.