O Brasil sofreu um duro golpe na sua democracia. E tudo começou em 2014. A economia estava estável, a inflação começava a desacelerar para 1,24%, o dólar caia pelo quarto mês consecutivo e fechava em R$ 2,412 e a taxa de desemprego ficava em 4,8%, menor índice da série histórica. Porém, apesar dos bons ventos, a imprensa era implacável com o Governo.
Ecoava no Brasil o coro pessimista do “não vai ter Copa”. Revistas de oposição chegava a afirmar que já existia planos de transferir a Copa para Londres pela incapacidade do Governo brasileiro de fazer as obras necessárias. Em outra matéria afirmava que os estádios só estariam prontos em 2036. Bem, teve Copa.
Impressionantemente, num país onde as coisas ainda estavam indo bem, a presidente da República teve de ouvir de um estádio, o coro de: Ei, Dilma, vai tomar no cu.
Após o sucesso da Copa, frustrando a imprensa de oposição, viriam as eleições. E aí era preciso acabar com a popularidade da presidente de vez. Uma operação surgida em março de 2014 para investigar crimes de lavagem de dinheiro numa rede de postos em Curitiba chegava à mídia com personagens envolvidos em desvios de dinheiro na Petrobras. Em junho, Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Yussef virariam atores diários nos telejornais e presença certa nas revistas semanais, com suas delações premiadas misteriosamente, e criminalmente, vazadas.
CAPAS DA VEJA NO PERÍODO ELEITORAL
“Fraudes – CPI da Petrobras”, “Eram malas de dinheiro”, “Não vamos desistir do Brasil – Eduardo Campos”, “Marina Presidente?”, “Como Dilma e Aécio tentam parar Marina”, “O delator fala – Paulo Roberto Costa”, “A fúria contra Marina”, “As armas para decisão”, “A Cartada Final – Foto de Aécio e Marina”, “O fator surpresa – foto de Aécio sorrindo”, “O doleiro fala – Doleiro liga Dilma e Lula ao esquema da Petrobras”, “Eles sabiam de tudo – Foto de Dilma e Lula com tons soturnos”, “Operações Mãos Sujas – capa com Moro e a informação que ele poderia ser tirado do caso”. Bem, essa foi a sequência de capas da Veja até as eleições. Mas Dilma venceu. E até mesmo na capa que falaria sobre a reeleição dela, a foto triste da presidente com a cínica frase: “A solidão da vitória”.
ELEIÇÕES VENCIDAS
Vencida as eleições era hora de reunir o país e… nada disso. Agora era hora de inviabilizar o governo. O senador José Anibal, pelo twitter, mandou a mensagem no dia 21/10/2014. Lacerda dizia de Getúlio:“Não pode ser candidato. Se for,não pode ser eleito. Se eleito, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar”. Justo ele que combateu o Golpe de 64 como filiado da Organização Revolucionária Marxista Política Operária. Mas foi dito e feito. O PSDB pediu recontagem de votos, auditoria independente nas urnas. E teve tudo, mas perdeu.
Dilma tenta agradar o mercado e chama Joaquim Levy para a economia, contrariando o PT e os seus eleitores conscientes. Um absurdo e um erro crasso, comemorado pela imprensa.
O Congresso começa a fazer oposição ao governo e iria barrar projetos importantes, chantagear o governo com pautas-bombas para serem aprovadas em detrimento de votações favoráveis ao Planalto.
GÊNESIS DO GOLPE
No Congresso Nacional uma frente liderada pelo PMDB, elege um dos principais adversários de Dilma como presidente. É o início do Golpe. Eduardo Cunha (PMDB) recebe 267 e Júlio Delgado (PSB) 100, contra os 136 votos de Chinaglia (PT) e 8 de Chico Alencar do PSOL. Ou seja, o Governo perdia por 367 a 136. Nesse dia, 1º de fevereiro de 2015, já se falavam que Cunha era o homem que poderia aceitar o pedido de impeachment de Dilma, que completava sem 1º mês do novo governo. Já se planejava o Golpe que veio pelo placar de 367×137. Coincidência?
Após a derrota no Congresso a presidente solicita ao vice-presidente que assuma a articulação política, em abril. Temer assume. Porém, em agosto, para agradar ao PSDB, principal partido de oposição, ele deixa a articulação.
PAPEL DA IMPRENSA NO DESGASTE DA IMAGEM DO PT E DO GOVERNO
Na mídia, as denúncias contra Lula e o PT passam a ser diárias. Os vazamentos ilícitos da Lava Jato seguem a todo vapor. É a Operação sobre segredo de justiça mais vazada de todos os tempos. Lula vira o alvo principal. A política já sabe que se não prenderem ele, 2018 o PT vencerá pela quinta vez as eleições. Começa uma campanha difamatória e de desconstrução de uma imagem como nunca vista na história desse país. Um presidente que saiu do governo com aprovação superior a 80%, começa a ter sua reputação jogada no limbo. Acusam ele de ter ganho dinheiro de empreiteiras para fazer palestras que não existiram, mas ele prova o contrário. Tentam, até hoje, a todo custo colocá-lo como dono de sítio em Atibaia e um Triplex no Guarujá, mas não conseguem nenhuma prova desse ato. Não importa. Uma hora a prova será “plantada”.
Delcídio do Amaral (na época do PT) é preso em novembro tentando negociar com filho de Cerveró para que o pai não fechasse um acordo de Delação Premiada com o MPF. Delcídio havia sido diretor de Gás e Energia da Petrobras entre 2000 e 2001, no governo FHC quando trabalhou com Cerveró e Paulo Roberto Costa. Como no vazamento ficou claro que o pedido era para livrar ele das imputações da lei, o PT nega apoio a Delcídio. Como vingança, e já na cadeia, Delcídio tenta incriminar Dilma e Lula.
Com o escândalo, agora a função era tentar ligar a Lava Jato ao impeachment de qualquer forma. E mesmo sem nenhuma ligação processual, se você perguntar a qualquer pessoa, ela irá justificar o impeachment com a Lava Jato. A mídia foi brilhante nisso.
A CHANTAGEM E O GOLPE
Mas é uma outra chantagem que virá a ser decisiva na história política do país. Eduardo Cunha, presidente do Congresso Nacional, se vê em meio a um mar de denúncias contra ele. Cunha é acusado por diversos presos da Lava Jato como sendo o homem da propina do PMDB. Seu nome vira presença constante em quase todas as delações premiadas. E quando sua situação começa a complicar tenta um golpe final. Chantagear a presidente. Sem o apoio do PT e dos seus votos no Conselho de Ética da Câmara, cunha perderia. E perdeu. Num processo que contou com inúmeros atrasos, postergações, manobras e etc, mas perdeu. Porém, seu processo de cassação é o maior da história do Congresso Nacional e até a presente data, não foi votado.
Sem o apoio do PT Cunha desengavetou um processo, exigiu algumas mudanças para aceitá-lo e deu início ao golpe em dezembro/2015. O processo de autoria de Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal, possuía até papel timbrado do PSDB, partido derrotado desde 2002 em eleições presidências. Janaína admitiria depois ter recebido R$ 45.000,00 do PSDB para elaborar o pedido de impeachment.
Apenas 4 dias depois o golpe fica explícito com uma Cartinha de Temer para a presidente da República, publicada pela imprensa antes mesmo de chegar às mãos de quem deveria. O golpista Michel Temer mostrava sua cara.
Em março, após 12 anos no governo e 5 anos contando com o Vice-Presidente da República, e com 6 Ministros de Estado, o PMDB rompe com o governo Dilma, mas deixa o vice lá para ser empossado. Esse ato pode ser entendido como a cara do Golpe. O evento de saída do governo durou 5 minutos e foi presidida pelo Senador Romero Jucá.
Dia 17 de abril, numa das sessões mais ridículas e vexaminosas, o Congresso vota o impeachment. Os motivos são os mais variados. Por Deus, pela família, pelo neto, pelo estado, pela vó, pelo ForaDilma, pelo movimento social Revoltados Online (acredite), pelo fim da corrupção… mas nenhum votou pelo motivo que realmente deveria importar. Aliás, os motivos do impeachment foi o que menos importou.
Poucos dias depois, “vaza” um discurso de posse, feito pelo whatsapp, de Michel Temer, antes mesmo do afastamento da Presidente da República. Tão patético quanto a cartinha à Presidente.
O MOTIVO PRINCIPAL
Em maio, o senador Romero Jucá, é pego em ÁUDIOS (e não só delações) explicando o passo a passo do Golpe. Explicitamente ele diz: “A solução mais fácil é tirar ELA e colocar o Michel. Só o Renan que está contra essa porra. Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Cunha. Gente, esquece o Cunha, o Cunha está morto, porra”. Na sequência do diálogo, Sérgio Machado destaca que é preciso “botar o Michel num grande acordo nacional”. “Com o Supremo, com tudo”, enfatiza o Jucá.
Bem, na votação do Senado apareceu o tal pacto. Aos risos, Jucá é flagrado ao lado de Renan. Não teve coragem de arguir a Presidente e o presidente do Supremo Tribunal Federal viu entrar na pauta do Senado o reajuste dos salários do STF. Logo, fez-se o pacto.
O PROCESSO CORRETO COM INÍCIO “VICIADO”
O processo do golpe seguiu o rito do impeachment, para tentar dar aspectos legais ao “pacto”. A defesa brilhante do ex-ministro Eduardo Cardozo de nada adiantaria, pois os votos já estavam definidos (negociados), como afirmou um senador-juiz. Ele disse: “o senhor pode apresentar a prova que quiser, nada mudará os votos”. Ou seja, era um jogo de cartaz marcadas.
Uma senadora do PMDB ao sair da primeira votação do processo de admissibilidade do impeachment declarou: “o partido agora está fechado com o Temer”. A frase que passou despercebida por milhões de pessoas, proferida no Jornal Hoje, da Globo, mostra claramente que ao invés de votarem um impeachment os senadores estavam fazendo uma votação indireta.
De nada adiantaria mais ele dizer que as “pedaladas” nunca foram consideradas crimes de responsabilidade, e por isso, não poderiam ser agora. Ou que os créditos suplementares estão previstos na LOA e não geram ônus extras ao Estado. Todos sabem, mas a verdade não importa. Já estava tudo negociado.
O próprio Auditor do Tribunal de Contas da União que condenou as contas de Dilma, assumiu que ajudou o promotor a fazer o processo que ele aprovaria. E nada aconteceu.
Porém, o que os senadores não contavam, era que Dilma aparecia no Senado. E lá, na frente de seus inquisidores, jogaria por terra qualquer argumentação a favor do seu impeachment. Foram 15 horas exaustivas para todos, mas ela estava lá. Rebateu e explicou cada ponto da acusação. Fez um discurso brilhante, exaltando sua trajetória idônea e sua caminhada até aquele dia. Chamou de golpe, na cara dos golpistas. Disse que não era covarde e não traia, numa clara declaração aos golpistas que pularam do governo. Foi digna e respondeu com firmeza ao dono do helicóptero com 500kg de cocaína sem citar esse episódio. Respondeu ao dono de fazenda com trabalho escravo, com altivez. Chamou Aécio de candidato derrotado. Mostrou ao mundo que o golpe era um golpe e teria envergonhado boa parte dos inquisidores, se vergonha eles tivessem.
O FINAL
Não adiantou. Perdeu seu mandato por “pedaladas fiscais” em operações de suplementação de crédito que, acreditem, 2 dias após o impeachment, seriam autorizadas numa lei sancionada pelo vice traidor (já que ele não quer ser chamado de golpista).
O Supremo Tribunal Federal receberia o aumento salarial no mesmo dia da votação do impeachment, pagamento do “grande pacto nacional” alardeado por Jucá. Mas o PSDB não gostou da manobra do PMDB em manter os direitos políticos da presidente afastada e barrou a votação do aumento do STF. O partido que deu o golpe no país estava pensando mais à frente, em seu filiado Eduardo Cunha que também deverá ser cassado algum dia.
O senador do PDT, Acir Gurgacz, logo após o impeachment ser decretado afirmou que: “nós temos consciência que não houve crime, porém a presidente não teria mais governabilidade”. Ou seja, não houve crime. Impeachment sem crime, é golpe.
O senador Romero Jucá, aquele que falou em parar a sangria da Lava Jato e tirar Dilma para barrar o avanço das investigações, assumiu a presidência do PMDB e a Vice-Presidência do Senado Federal, ao lado do Renan, que não gostava do Michel, porque o Michel é Cunha.
Temer acusado de receber 10 milhões em propinas, não poderá mais ser investigados por crimes anteriores a sua nomeação.
Cunha poderá ser cassado, mas já informou que irá pleitear que os seus direitos políticos sejam preservados, assim como os de Dilma.
E esse é o resumo do golpe. É isso que vivemos aqui no Brasil. E quem foi para passeatas com camisa da CBF para lutar contra a corrupção, se cala diante de tantos fatos e pararam de bater as panelas.
Agora é aguardar as cobranças dos que investiram nesse golpe ardil. Ah, e se faltava o exército nas ruas, o novo Governo já autorizou o exército a ajudar a PM de São Paulo a barrar manifestações nesse domingo, 4 de setembro de 2016, na Av. Paulista.